Rodolfo Ori tirando um cochilo na linha do trem, digno de desenho animado... |
Na noite anterior eu mal consegui dormir, tamanha a excitação e ansiedade para começar logo a caminhada. Pra variar eu fui o último a dormir e o primeiro a acordar. Como não gosto de fazer nada correndo, resolvi acordar um pouco mais cedo e tomei banho com calma e pude arrumar minhas coisas tranquilamente. Quando o pessoal acordou, eu já estava na mesa tomando o café da manhã. Levei comigo apenas uma pequena mochila com uma toalha e uma troca de roupas. Por incrível que pareça eu iria terminar a viagem com menos de 5Kg nas costas, muito diferente dos 25Kg do alforje no inicio da viagem. A Bianca gentilmente me emprestou um boné, para proteger do sol. Ali começava a minha aventura a pé rumo à Aparecida. Estava começando a 1ª parte final da viagem. Ficou determinado que faríamos o trecho de 72Km em duas etapas. A primeira parte seria de 40Km até Pindamonhangaba e o segundo trecho de 32Km no dia seguinte até Aparecida. No melhor percurso de toda a viagem para o ciclista, eu faria o trajeto a pé. Pra quê facilitar se a gente pode complicar as coisas. Risos!
Antes de começar o relato, deixa eu apresentar meus companheiros de caminhada. Vou começar pelo Rodrigo de Brasília, o líder do grupo. O Rodrigo trabalha como taxista na capital do país. É ultramaratonista e tem um preparo físico invejável. Antes dele me explicar eu nem fazia ideia o que era ultramaratona. É um sujeito muito engraçado e foi um dos responsáveis por eu terminar a viagem. Logo mais vocês irão saber porque. O Rodolfo da foto acima é da zona oeste de São Paulo, torcedor fanático do Palmeiras, assim como eu, sem conhecer eu já sabia que só podia ser gente boa. É um sujeito bem tranquilo e ponderado. Já fez caminhadas pelo Brasil e recentemente esteve em Machu Pichu, no Peru. Durante a caminhada conversamos bastante, foi até algo natural, pois disputávamos o título de retardatário do grupo. Ora eu, ora ele estava na rabeta da galera. O Marcos veio de São Carlos, mas começou a caminhada em Águas da Prata. Do grupo, talvez foi o que menos conversou comigo. Eu percebi que ele estava muito ansioso para chegar em Aparecida. Fiquei sabendo que ele tinha um motivo bem especial para fazer o CF. Queria que a mulher engravidasse. Há tempos estavam tentando ter um filho. E finalmente, o Seu Francisco. Ele tem uma história muito peculiar. Saiu de casa, em Pouso Alegre/MG e foi caminhando até Paraisópolis onde o caminho da fé tinha a sinalização. E o detalhe mais interessante, que ele fez tudo sem planejar. Deu um lampêjo na cabeça e resolveu sair andando. Ele veio de calça e camisa social e um sapato de couro bico quadrado. Esse sofreu pra concluir o caminho. De todos ali, eu tiro o chapéu para o Seu Francisco. Mais tarde conto mais sobre ele.
Quando começamos a andar eu senti como se estivesse caminhando com velhos amigos. Uma sensação inexplicável. Só o caminho da fé para proporcionar esse tipo de coisa. A medida que os quilômetros eram vencidos, as histórias de cada um eram passadas um para o outro. E nessa tônica a viagem transcorreu até o destino final. Muitas histórias foram contadas e ouvidas. Os primeiros 10 Km eu nem senti. Naquele instante tive a sensação que poderia chegar à Aparecida num só dia. Ledo engano. A coisa iria ficar pior em pouco tempo. A quilometragem inicial coincidiu com a chegada na linha do trem. Por ali a história seria outra. Andar 13Km pelos dormentes da linha do trem, teria um preço. E um preço alto a pagar no final do dia. Até aquele momento era só festa. Quase no final do trecho da linha do trem chegamos na estação Lefvre. Paramos para descansar e tomar água. Eu comecei a perceber que o pessoal estava imprimindo um ritmo forte. Eu e o Rodolfo andávamos sempre atrás do grupo. O Rodrigo sempre na frente, seguido do Marcos e do Seu Francisco. As 13:00 h chegamos no bar do Rancho Fundo e paramos para almoçar. O sol estava inclemente, castigava o corpo e cozinhava os miolos. Ainda bem que a Bianca havia me arrumado um boné.
Depois da linha do trem o caminho se tornou cansativo e monótono. Andávamos pelo acostamento de uma estrada movimentada. Os carros passavam e jogavam aquele poeirão na nossa cara. Eu não queria ficar para trás. O Rodrigo já estava se distanciando do grupo. Nesse momento resolvi ligar o MP4 e embalado pelo Linking Park, comecei a andar num ritmo fortíssimo. Em pouco tempo ultrapassei todos os meus companheiros, inclusive o Rodrigo, o ultramaratonista do cerrado. Eu estava andando a 7Km/h. Isso iria ter uma consequência muito séria alguns quilômetros a frente. A gente andava, andava e só via aquela estrada de asfalto na frente. Aquela altura eu já dava sinais de extremo cansaço. Ainda faltavam 10 Km até o centro de Pindamonhangaba. Aos poucos fui perdendo o fôlego e o Rodrigo me alcançou. Depois veio o Marcos e o Seu Francisco. Olhei para trás e nem sinal do Rodolfo. Ele estava muito atrás do grupo, talvez alguns Kms de distância. Na minha frente eu também não conseguia enxergar mais ninguém. Todos haviam sumido. Eu estava sozinho de novo. O que me confortava era saber que o Rodolfo ainda vinha atrás de mim. Nesse instante comecei a me arrastar pra continuar andando. Fiquei preocupado. Quando atravessei a ponte sobre o rio, vi o pessoal parado numa barraquinha de coco. Na verdade, era uma birosquinha na beira da estrada. Parei e pedi dois côcos de uma vez, tamanha era a sede. Puxei uma cadeira e sentei. As pernas tremiam, principalmente a panturilha. Depois de 40 minutos o Rodolfo chegou...Estava exausto, mas em melhores condições físicas que eu.
Paguei a conta e quando fui me levantar a coisa ficou preta pro meu lado. Eu não conseguia dobrar a perna. Pior...eu não conseguia mais andar normalmente. Ainda faltavam 2Kms até o hotel. Fiquei assustado. Aí o Rodrigo me falou: "Lembra quando você ligou o Mp4 e saiu que nem um foguete pela estrada?" Pois é amigo, as consequências virão agora. Pensei: O caminho da fé acabou pra mim...Eu me arrastava e mancava de uma das pernas. A dor era insuportável. Vou pegar um táxi, não tenho condições de chegar no hotel. Com bastante paciência o pessoal ficou do meu lado e foi andando ao ritmo de tartaruga. Pela primeira vez, eu peguei o cajado emprestado e fui me apoiando. O CF mais uma vez estava testando as minhas forças e os meus limites. Com muito custo consegui chegar no hotel. Outro sacrifício hercúleo foi ter que subir as escadas até o 1º andar onde ficava o nosso quarto. O grupo se dividiu em dois quartos. O Marcos ficou com o Seu Francisco. No outro quarto, fiquei com o Rodolfo e o Rodrigo. Depois do banho, inconsolável eu disse aos amigos que não prosseguiria com eles. E, realmente, eu não tinha as mínimas condições físicas de seguir em frente. O Rodrigo com toda a sua experiência em maratonas disse que eu estava com um nódulo na parte de trás da perna e que precisaria de três coisas: remédio, massagem e descanso. O remédio ele tinha, a massagem ele fez para desfazer o nódulo e o descanso eu nem precisava me esforçar. Na hora da janta, eu pedi que me trouxessem um lanche mas o pessoal se recusou a ir na churrascaria sem a minha presença.
Desci as escadas com muito sacrifício. Andar se tornou uma tarefa penosa. Ainda bem que o restaurante ficava a um quarteirão do hotel. O pessoal se esbaldou na churrascaria. Pareciam leões famintos. Eu mal conseguia comer, estava cansado e com dores nas pernas. O pior momento foi quando pediram uma cerveja e o Rodrigo falou: "O Crispim não pode beber". Vai tomar o anti-inflamatório e o alcool pode cortar o efeito. Meu deu água na boca, ver o pessoal tomando aquela loirinha estupidamente gelada. Que castigo era aquele...Depois da janta, voltamos ao hotel e aí o bicho pegou. Veio a hora da massagem. O Rodrigo pegou uma pomada de arnica e começou a esfregar na panturilha. A dor era insuportável. Eu peguei até uma camiseta e coloquei na boca. Se os outros hóspedes me ouvissem gritando iriam achar que estaria ocorrendo um assassinato ou na pior das hipóteses, três boiolas fazendo uma suruba. Risos....Mesmo com tudo aquilo eu estava descrente de que iria conseguir sair andando daquele lugar. Seriam mais 30 Km pela frente até Aparecida. Fui dormir com a sensação de ter nadado e morrido na praia. Eu não tinha as mínimas esperanças de poder prosseguir a viagem. Um verdadeiro milagre iria começar a acontecer na manhã do dia seguinte...
Desci as escadas com muito sacrifício. Andar se tornou uma tarefa penosa. Ainda bem que o restaurante ficava a um quarteirão do hotel. O pessoal se esbaldou na churrascaria. Pareciam leões famintos. Eu mal conseguia comer, estava cansado e com dores nas pernas. O pior momento foi quando pediram uma cerveja e o Rodrigo falou: "O Crispim não pode beber". Vai tomar o anti-inflamatório e o alcool pode cortar o efeito. Meu deu água na boca, ver o pessoal tomando aquela loirinha estupidamente gelada. Que castigo era aquele...Depois da janta, voltamos ao hotel e aí o bicho pegou. Veio a hora da massagem. O Rodrigo pegou uma pomada de arnica e começou a esfregar na panturilha. A dor era insuportável. Eu peguei até uma camiseta e coloquei na boca. Se os outros hóspedes me ouvissem gritando iriam achar que estaria ocorrendo um assassinato ou na pior das hipóteses, três boiolas fazendo uma suruba. Risos....Mesmo com tudo aquilo eu estava descrente de que iria conseguir sair andando daquele lugar. Seriam mais 30 Km pela frente até Aparecida. Fui dormir com a sensação de ter nadado e morrido na praia. Eu não tinha as mínimas esperanças de poder prosseguir a viagem. Um verdadeiro milagre iria começar a acontecer na manhã do dia seguinte...
Recados 5957/58
Campos do Jordão-Pindamonhangaba
Chegando em Campos fui muito bem recebido pela Bianca que me deu boas dicas para conhecer a cidade. Almocei no mercado municipal, bar Truta Trutinha, especializados nesse tipo de peixe. Muito bom, $15 pilas a refeição. Depois fui dar uma volta pelo bairro do Capivari e na volta peguei o bonde que circula por diversos bairros. Deu para ter uma boa noção de Campos. Voltei para a pousada as 19:00h e encontrei 4 peregrinos que acabavam de chegar. Eles vinham depois de mim a pé e acabaram me alcançando.Risos...No momento do encontro foi uma festa só, conversamos durante o jantar e fui convidado a seguir junto com eles. A minha bike já apresentava problemas e era necessária uma parada para manutenção. Fui dormir pensando o que fazer no dia seguinte..
continua
Campos-Pinda
Acordei bem cedo e já tinha uma decisão tomada. Deixaria a bike e o alforje na pousada e seguiria a pé junto da trupe.
Rodrigo do Cajado (líder do grupo),Rodolfo Ori,Marcos de S.Carlos,Seu Francisco e eu...o quinteto estava pronto para a jornada final.
Foram muitas conversas, muitas histórias, muitas risadas e muito companheirismo durante os 42Km até Pinda. Eu como não estava habituado a andar tanto durante um dia só, cheguei me arrastando até o hotel. A perna esquerda travou e criou um nódulo na panturilha. A viagem no dia seguinte estava comprometida...
Foi aí que o Rodrigo me acalmou e disse: "Eu vou cuidar dessa perna!" E tome pomada, relaxante muscular e muita massagem para desfazer o caroço. A dor foi intensa e mal podia acreditar que seguiria amanhã...
Fotos
Manhã fria em Campos |
Mirante antes da chegada na linha do trem |
Dormentes |
E aí Rodolfo, o vagão parece não estar tão pesado... |
Chegando em Pinda |
Belo visual da região |
Rio, não me lembro o nome, antes de chegar na cidade |
Faltando 32 Km para Aparecida |
Uma oração na matriz antes de prosseguir viagem |
Interior da catedral, estava havendo uma missa |
Muito show..
ResponderExcluirParabéns..
o rio na foto chegando em Pinda.. é o rio Paraíba.
Abraços
Alex
Valeu Magrelo,
ResponderExcluirPois é, eu não me lembrava o nome desse rio. É o mesmo que corta Aparecida...
Um abraço!