segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Ouro Fino - Tocos do Mogi

Brincando com a própria sombra pouco antes de chegar à Tocos do Mogi



De Ouro Fino até Tocos do Mogi percorremos 47 Km. Antes desse trecho ainda paramos em Inconfidentes (Bar do Maurão) e Borda da Mata. Saindo de Ouro Fino não demoramos nem 2 horas para chegar ao Bar do Maurão. São apenas 9 Km de distância. Pra variar eu tive que buscar o Pedro lá no trevo da cidade avisando que o bar já havia ficado há 400 metros atrás. O Maurão é um personagem conhecidíssimo no Caminho da Fé. Já faz a peregrinação até Aparecida há mais de 20 anos. É uma pessoa extremamente feliz e de bem com a vida. Assim que desci da bike já fui recebido com um abraço caloroso. Como o Maurão acompanha o livro de visitas todos os dias sabia da minha chegada em Inconfidentes. Eu fui logo pedindo um cafézinho preto e um pastel de queijo. Foi quando ele disse: "Você compra um pastel e o sonrisal vem de brinde". Todos rimos. O fato de eu ter lido muitos relatos sobre o CF antes de fazer a viagem, criou em minha mente uma espécie de arquivo virtual sobre os lugares e as pessoas. Assim como a Dona Cidinha em Vargem Grande, a expectativa que eu criei em conhecê-lo foi muito grande. Conversamos longamente por mais de 1 hora, o Pedro já estava espumando de raiva...Por mim eu teria ficado ali a manhã inteira. Era muito gratificante estar na compania de um peregrino tão querido por todos e que demonstrava um apreço todo especial pelas pessoas que ali passavam. Era difícil eu explicar esse sentimento para o meu companheiro de Brasília.

Antes de ir embora de Inconfidentes ainda passei nos Correios e parei um minuto na frente da igreja para uma foto. Naquele momento o Pedro me disse: "A gente não pode perder tanto tempo assim..." Fingindo não ter ouvido aquela frase, virei para o lado e nada respondi. Esse já era um indício da nossa iminente separação. Eu ainda tinha intenção de entrar na igreja para fazer uma oração mas diante das circustâncias abortei a missão. O Pedro subiu na bike e disparou feito um foguete. Em poucos minutos o perdi de vista. Saindo da cidade pegamos um trecho de rodovia com tráfego intenso de carros e caminhões. O acostamento era precário. A entrada para a estrada de terra ficava do lado esquerdo, na contramão de onde pedalávamos. Eu nem preciso dizer o que aconteceu...mais uma vez a pressa demonstrou ser inimiga da perfeição. Tive que pedalar 2 Km para avisar ao meu amigo que ele havia passado a entrada do CF. Quando voltamos ele argumentou que o local estava mal sinalizado. Só para não brigar eu balancei a cabeça concordando...

Chegamos em Borda da Mata um pouco depois das 14:00 h. Paramos no hotel para carimbar a credencial e fomos almoçar no restaurante Casarão que fica próximo à igreja e a praça central. Durante o caminho eu ouvi muitas histórias de brigas entre peregrinos. Pessoas que começavam a caminhar juntas e depois de um certo tempo deixavam transparecer as diferenças. Até um proprietário de pousada me confidenciou essa situação. Por motivos óbvios não vou revelar a sua identidade. Eu não me surpreendi com este fato, é plenamente natural que isso aconteça. Nem todos tem a capacidade de ceder para evitar um conflito, principalmente quando se encontram duas pessoas de personalidade forte. Muitas vezes prefiro passar por "bobo" para evitar uma briga. Como meu companheiro de caminhada também era da paz, apesar das diferenças, conseguimos manter um bom relacionamento até ali. Logo depois do almoço seguimos em direção à Tocos do Mogi. A cidade de Borda da Mata não me agradou e embora estivesse muito cansado não me importei de continuar, diferentemente do que aconteceu em Inconfidentes.

No caminho para Tocos encontramos o Sr.Juca, um sitiante da região. Ele vinha de moto na direção contrária. Acenou pra gente e paramos para conversar. Naqueles poucos minutos de conversa uma lição de vida nos foi dada. Ele repetia uma frase de forma natural e espontânea como se fosse um mantra: "A vida é boa, é só a gente saber o que faz dela". Tinha uma fala mansa e um sorriso fácil, típico das pessoas de bom coração. Nos convidou para visitar o sítio e tomar um café ou um refrigerante. Antes que eu pudesse aceitar o convite, o Pedro foi logo dizendo que estávamos com pressa e precisávamos chegar logo em Tocos. Pra mim foi mais uma oportunidade perdida. Contrariado mas conformado, me despedi do Sr. Juca e segui em frente. Ainda argumentei com o Pedro o porquê da recusa em conhecer a propriedade, ele me disse que iríamos "perder" muito tempo. Eu dei uma risada nervosa, balancei a cabeça e demonstrei toda a minha insatisfação com sua atitude.

Faltando 8 Km para chegar em Tocos parei para descansar no sítio da família Xavier. Não havia ninguém mas a porteira estava destrancada. Entrei para tomar água e sentei para esticar as pernas. Não havia nenhum sinal do Pedro ter parado por ali, certamente ele vinha tão rápido que nem prestou atenção na placa. Quando deixei o sítio consegui avistá-lo no alto do morro. Assim que me aproximei percebi que ele estava com o braço sangrando. Perguntei o que havia acontecido. Pensei por um momento que havia caído da bicicleta. Aí que me contou que havia subido num barranco para lançar sementes no pasto e ao desequilibrar-se caiu por cima do braço. Provavelmente se feriu na quina de uma pedra que estava próxima. Abri meu alforge e procurei o kit de primeiros socorros. Fizemos um curativo e quando chegou na cidade ele procurou o posto de saúde para tomar 3 pontos. Em decorrência do ferimento, ele não tinha muita firmeza no braço machucado. Controlar a bike principalmente nas descidas se tornou uma tarefa bastante complicada. E pela primeira vez eu conseguia andar na frente dele. Chegamos em Tocos quase anoitecendo e a nossa primeira providência depois que achamos a pousada foi procurar um posto médico.

O posto de saúde estava fechado e então resolvemos procurar uma farmácia. O farmacêutico receitou um anti-infamatório e deu 3 pontos falsos. Problema resolvido, fomos jantar no bar da Gilda. Eu não gostei muito da cara da comida e por isso resolvi comer uma pizza. O Pedro pediu um lanche e uma salada. Depois disso virou pra mim e disse: "Posso lhe dizer uma coisa, você não ficar chateado?" Eu sabia que coisa boa não podia ser. Respondi que podia falar sem problema nenhum. Aí ele soltou essa: "Desculpe eu falar, mas acho você muito lento" Aquilo caiu como uma bomba nos meus ouvidos. Respondi dizendo: "Não sou eu que sou lento é você que é muito afobado" Seu sorriso amarelo evidenciou a surpresa da minha resposta. Será que ele quis dizer que eu era lento de uma forma geral ou que eu estava lento fazendo o caminho da fé? Eu acreditei na primeira hipótese e jamais concordaria com tal afirmação absurda. Como eu podia ser lento, praticando um esporte como o páraquedismo? Como eu podia ser lento morando e trabalhando numa cidade como São Paulo? Como eu podia ser lento tendo que tomar decisões rápidas no poker e no trading, atividades que tenho como uma renda extra? Ele não me conhecia o suficiente para ter feito aquele juízo de valor. A imagem que eu tinha dele foi desconstruída em apenas 3 segundos. Depois disso voltamos para a pousada do peregrino. Fui descansar não acreditando no que tinha ouvido no restaurante...


Recados 5890/91/92

Ouro Fino-Bar do Maurão

Saímos pela manhã de Ouro Fino rumo a Inconfidentes. O Pedro sempre vai na frente...descansa um pouco e espera eu chegar. E assim vamos no caminho todo. As vezes ele vai tão depressa que erra o caminho, o guia do Olinto fica no bagageiro da bike e quando ocorre alguma dúvida eu consulto o guia e confronto com a quilometragem do meu ciclocom****dor. Dessa forma, não me perdi em nenhum momento.

Antes de eu me encontrar com Pedro em Aguas da Prata, ele se perdeu no trajeto Vargem Grande-São Roque da Fartura e desceu 4Km de serra pelo lado errado, quando chegou lá embaixo teve que subir tudo de volta...Rs..rs..rs

Quando chegamos em Inconfidentes o Pedrão estava lá na frente e passou batido pelo bar do Maurão, eu vinha bem atrás e já havia avistado o bar...

Assim que passei pelo bar ouvi alguém gritar: "Ô Crispim, é aqui!!!" Era o Maurão nos esperando...Fui atrás do Pedro quase no trevo da cidade para ele voltar. 

O Maurão estava lá na porta do bar e me recebeu com um abraço bem caloroso, como se esperasse um velho amigo...me convidou logo para tomar um cafézinho e comer um pastel. Foi o que fiz. Ficamos por lá cerca de 1 hora batendo um papo bem agradável e eu ouvindo as histórias de um peregrino que faz a caminhada há 23 anos. Sensacional!!! A minha vontade era ficar ali pela manhã toda, mas meu companheiro de caminhada já sinalizava para partirmos...

Foi então que tiramos uma foto todos juntos e nos despedimos. Aquele período que fiquei por ali teve um significado muito importante pra mim.

Obrigado Maurão, um grande abraço!!!



Inconfidentes-Borda da Mata

Logo na saída da cidade pegamos a rodovia. Um trecho bem perigoso para pedalar, com acostamento precário e um tráfego intenso de caminhões e veículos. Ainda bem que o trecho na estrada é curto. O Pedro seguia na frente e acabou passando da entrada do Caminho. Lá fui eu atrás dele para avisar que deveríamos voltar. Não é fácil, não...O homem é atleta, corre em maratona, e pratica vários esportes 4 vezes por semana. Imagina só o preparo físico dele, e eu, sofrendo para acompanhar seu ritmo...No final, tudo deu certo e seguimos no caminho certo...

Borda da Mata-Tocos do Mogi

Passamos no hotel em Borda da Mata carimbamos a credencial e depois do almoço seguimos para Tocos do Mogi. Nesse trajeto o Pedro caiu de um barranco e machucou o braço. NADA grave...



Fotos

Divisa de municípios Ouro Fino-Inconfidentes

Igreja de Inconfidentes

Trevo

Eu não parei na pousada Águas Livres, passei direto

Seu Juca

Ponto de apoio

A minha sombra projetada sob uma ponte de madeira

Pedro pegando as sementes para lançá-las no pasto

Essa árvore caiu segundos antes de passarmos

Só faltam agora 274 Km até Aparecida

Uma das muitas capelas construídas ao longo da estrada

Estacionamos as bikes para um descanso

Divisa de municípios

Olha a casinha do João de Barro lá no alto da árvore

Mais uma vez meu amigo vindo em meu socorro

Ao fundo já é possível avistar Borda da Mata

Local onde almoçamos

Igreja matriz de Borda da Mata

Estrada para Tocos

Sítio da família Xavier

Estrada próxima ao sítio da foto anterior

Que bela paisagem!

Chegamos no limite entre Borda e Tocos

Olha o curativo no braço esquerdo do Pedro

Faltam 200 Km...

Quase chegando em Tocos do Mogi

Rua principal

Pousada da Dona Terezinha

Subindo a ladeira e deixando a cidade...

Igreja de Tocos do Mogi

5 comentários:

  1. Muito bom o relato

    Apesar de estar parecendo mais um relato sobre o Pedro do que Caminho da Fé he he

    Quando ele falou que vc é lento deve ter falado sobre vc precisar treinar mais.. e não soube se expressar..

    Abraços

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    1. Bom Dia Magrelo,

      Tudo na paz? O que estou querendo demonstrar são as diferenças entre pedalar sozinho e pedalar acompanhado. Parece apenas um detalhe simples, mas não é. A sua rotina passa a mudar e os conflitos são inevitáveis. Como ficou demonstrado nos relatos, eu sou muito grato pela compania do meu amigo Pedro, mas tudo tem seu preço.
      Cabe a cada um tirar as suas conclusões e dosar os prós e contras em pedalar sozinho ou acompanhado.

      Um grande abraço!!!

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    2. Sei bem como é isso viu..
      a primeira vez que fiz o CF fui sozinho

      a segunda fui acompanhado de um grupo que foi se desfazendo logo no primeiro dia

      fora conflitos bobos por causa uma palavra dita da forma errada na hora do cansaço, fome, sol quente na cabeça.

      tem que estar em sincronia mesmo pra pedalar em grupo, ainda mais em uma cicloviagem.

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  2. Grande Crispim,

    Iria comentar somente no final da sua jornada, mas não pude deixar de comentar aqui.

    As pessoas sempre nos surpreendem. Algumas de uma forma positiva, outras infelizmente...

    Nesse caminho da fé tive muito tempo pra refletir nessa questão e cheguei a uma conclusão: no meu caso, a culpa era minha.

    Eu esperava determinada reação das pessoas, determinada atitude, gesto, palavra, e quando isso não acontecia ou acontecia de forma diferente da que tinha imaginado, me frustrava!

    Caminhando tive a oportunidade de realmente aprender e finalmente compreender que ninguém é igual a ninguém,a não esperar que a pessoa pense e aja da mesma forma que eu, que faço no mesmo tempo e do mesmo jeito...Entendi e passei a aceitar as diferenças.

    Assim como eu fazia, acredito que muitas pessoas esperam demais das outras...e se frustram!

    Percebi claramente que o pouco para mim, talvez seja tudo o que a pessoa tem pra oferecer! E essa percepção mudou a minha forma de enxergar a vida e as pessoas.

    Um dia o Pedro entenderá isso, pois tenho certeza que ele não fez por mal.

    Agora deixa eu continuar lendo seu relato.

    Grande abraço meu amigo!

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  3. Faço o Caminho a pé e estava procurando onde fica o Sítio da família Xavier (não lembrava), aí cheguei aqui no teu post.

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